Fairbnb – por um turismo voltado à comunidade

Por Bia Martins

Imagine uma plataforma digital de hospedagem que, ao contrário do Airbnb, traga um impacto positivo para as cidades e seus moradores. Mais do que isso, que seus lucros sejam reinvestidos em projetos sociais voltados às regiões que recebem os turistas. Parece um sonho, mas já está se tornando realidade: essa é a proposta da Fairbnb, que se define como uma solução inteligente e justa para um turismo voltado à comunidade.

A iniciativa reúne ativistas, desenvolvedores, pesquisadores e designers que querem colocar de volta o conceito de “compartilhar” na Economia do Compartilhamento. Para isso, criaram uma plataforma para oferecer uma alternativa de turismo centrada na comunidade, que priorize as pessoas no lugar do lucro, favorecendo uma experiência de viagem autêntica e sustentável.

Ainda em fase de testes, a plataforma será lançada, em versão beta, em abril de 2019 nas cidades de Amsterdam, Barcelona, Bolonha, Valência e Veneza. Sem grandes investidores do mercado, o empreendimento tem crescido lentamente com o aporte financeiro desse grupo inicial e, em breve, deve lançar uma campanha de crowdfunding para poder ampliar seu alcance.

O projeto segue o modelo do que vem sendo chamado de Cooperativismo de Plataforma. Em seu manifesto, os adminstradores afirmam que sua propriedade é coletiva, de todos aqueles que a usam ou são impactados por seu uso, como anfitriões, hóspedes, comerciantes locais e vizinhos. Sua governança será democrática, baseada na colaboração e no consenso, com espaço para que membros da comunidade possam decidir coletivamente como a plataforma irá operar na sua vizinhança. Do mesmo modo, pretendem trabalhar com os governos locais para promover regulações que incentivem o turismo sustentável.

O objetivo maior do projeto é fazer frente ao que entendem como processo de gentrificação derivado da expansão de hospedagens pelo Airbnb. O problema é que, quando uma parte significativa de habitações numa região da cidade são voltadas ao turismo, todo o seu entorno se transforma: as antigas lojas fecham para dar lugar ao comércio para turistas; os preços dos alugueis sobem astronomicamente; os antigos moradores acabam tendo que se mudar para regiões mais em conta e, com isso, os laços de vizinhança se esvaem.

Em várias cidades do mundo, tem sido tomadas medidas para frear esse processo. Em Nova Iorque, pela nova legislação, não é permitido alugar imóveis completos por menos de 30 dias, a não ser que o proprietário esteja presente e para até no máximo dois hóspedes. Já em Amsterdam existe o limite de 30 noites por ano para a oferta de hospedagem num imóvel nesse tipo de plataforma. Em Barcelona, são os moradores que protestam com grafites nas ruas: “Turistas, vão pra casa; os refugiados são bem-vindos”.

Indo na contra-mão desse modelo de turismo extrativista e predatório, a Fairbnb preconiza a sustentabilidade social. A proposta é que seus lucros sejam reinvestidos em projetos para a comunidade, como cooperativas de alimentos, playgrounds, hortas comunitárias etc. Recentemente, foi iniciada uma parceria em Veneza com a Association Masegni & Nizioeti, que atua em campanhas educativas e ações concretas pela preservação do patrimônio histórico e artístico da cidade, como a limpeza e restauração de monumentos e obras artísticas que sofreram pixações.

Association Masegni & Nizioeti em ação na limpeza das pixações em Veneza

Além disso, os administradores se comprometem a compartilhar os dados e trabalhar para que as regras de cada cidade sejam respeitadas. Outra medida prevista é a restrição de um imóvel por anfitrião, para impedir que uma pessoa alugue mais de um imóvel, o que é uma maneira de garantir mais compromisso dos anfitriões com sua vizinhança.

Esta aí um caso concreto, dentro do modelo de Cooperativismo de Plataforma, que merece ser acompanhado e incentivado. Se temos criticado as empresas da chamada Economia do Compartilhamento, como Uber e Airbnb, por representarem na verdade novas formas de expropriação e exploração, é preciso observar de perto as iniciativas criadas a partir do conceito de produção entre pares para aprender com seus acertos e eventuais tropeços, a fim de que esse modelo baseado em sustentabilidade e bem comum prospere.