Seminário Comunicação, Política e Democracia

Por Bia Martins

O impacto das fake news em campanhas políticas representa um sério risco para a democracia. Não só porque a desinformação tem garantido mundo afora a vitória de candidatos e propostas políticas extremistas – como Trump, Brexit e Bolsonaro –, mas também porque os próprios valores caros à democracia, como a defesa dos direitos humanos por exemplo, vêm sendo atacados com estratégias sofisticadas de comunicação que distorcem dados e fatos, quando não simplesmente espalham mentiras para manipular a opinião pública.

Com essa discussão de fundo, a  Diretoria de Análise de Políticas Públicas (DAPP) da Fundação Getúlio Vargas promoveu no dia 16 de julho o Seminário Comunicação, Política e Democracia com a presença ilustre do professor e pesquisador espanhol Manuel Castells.

Castells começou sua fala lembrando que as sociedades desde sempre se baseiam em relações de poder, entre o poder instituído e o contrapoder, ou o poder de resistência da sociedade, numa disputa que se dá pela conquista das mentes das populações. Daí o lugar central da comunicação não só para entender as relações de poder mas, principalmente, para transformá-las. Sendo assim, as mudanças nas tecnologias de comunicação deslocam também as formas de relação de poder.

Hoje a comunicação pelas redes sociais se dá em tempo real, o que traz enormes consequências. No entanto, ressaltou, é importante observar que ao mesmo tempo que a comunicação é distribuída e descentralizada, ela se baseia em um sistema de informação concentrado, já que os dados que circulam por elas são coletados e processados de forma centralizada por governos e empresas, inclusive à nossa revelia. Quanto mais participamos, mais somos vigiados. Mas, ao mesmo tempo, nunca antes tivemos tantos recursos para vigiar de volta o poder estabelecido, por exemplo, filmando com nossos smartphones o que consideramos digno de denúncia.

Atualmente, enfatizou, as disputas políticas se decidem principalmente pelas redes sociais e só depois são incorporadas pelos meios de comunicação de massa. Assim é importante compreender qual é o sistema mental de construção das narrativas e de recepção das mensagens. Segundo ele, a neurociência social mostra que somos fundamentalmente animais emocionais. Reagimos em primeiro lugar através de nossas emoções, para só depois racionalizá-las. Por isso, de modo geral, selecionamos as mensagens que queremos receber e as que não queremos receber, o que vale para todos os aspectos da vida, especialmente no debate político. Assim, nossa relação com as redes sociais não é para nos informarmos, mas para confirmarmos nossas convicções. A consequência desse fenômeno é a destruição da esquerda tradicional em todos os países, pois os argumentos racionais, que costumam usar para convencer as pessoas da importância de suas causas, não têm mais espaço nesse novo ambiente. 

Estrategistas de campanhas políticas de direita, como Steve Bannon, sabem muito bem disso, e exploram essa vulnerabilidade além de qualquer limite ético. Se considerarmos o baixo nível escolar e a precária formação cultural e política de nossa população, que deixam os cidadãos com poucos recursos para irem além da primeira reação às informações que circulam pelas redes sociais, temos aí um terreno fértil para a propagação de propostas antidemocráticas e até mesmo para a implantação de uma ditadura sutil, termo usado por Castells para se referir ao governo Bolsonaro.

O seminário teve ainda a participação do diretor da FGV DAPP, Marco Aurelio Ruediger, do presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, e da editora da Revista Piauí e professora, Fernanda da Escóssia.

O encontro começou com Fernanda de Escóssia apresentando uma pesquisa muito interessante sobre a circulação de fake news durante a campanha eleitoral de 2018. Em seguida, Felipe Santa Cruz falou da necessidade de se buscar novas formas de regular o debate público no ambiente digital a fim de se garantir a prevalência dos valores democráticos em nossa sociedade. Por fim, Marco Aurelo Ruediger mostrou a flutuação da polarização política no país através de dados de pequisas recentes realizadas pela DAPP sobre as interações no Twitter desde as eleições de 2018 até as votações mais recentes do Congresso Nacional.

Fiz um relato muito breve aqui, várias outras questões interessantes foram abordadas no encontro. O vídeo é longo, quase duas horas, mas vale muito assistir.

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